Como outras correntes da Filosofia, o existencialismo marca o seu
tempo. Compreende-se que o século vinte tenha produzido
esta forma de pensamento. Pensamento traduzido numa
filosofia que melhor responde ao tempo vivido, a partir
da Primeira Grande Guerra Mundial. Começa, neste período
a estar em causa a preservação da existência humana,
como se verificou com a Segunda Guerra Mundial, e outras
ocorrências ulteriores, outras Guerras. Desta forma, o
existencialismo não é uma filosofia que,
prioritariamente, se contraponha a quaisquer outras
correntes de pensamento, mas sim uma forma de dar
resposta àqueles para quem a vida humana mais não é do
que um simples instrumento, que pode ser útil em
determinado momento mas que, depois, se ostraciza ou
destrói, quando deixa de ter utilidade; para quem, o
cidadão, que perde esta qualidade, às mãos de déspotas
ou de personalidades toscas, não passa de simples número
estatístico.
É tal a força deste novo modo de pensar (o existencialismo) que
influenciará todas as formas de expressão do pensamento,
no decurso do século XX. Nenhuma manifestação humanista
ficou incólume à sua presença: da filosofia à literatura, do ensaio ao
teatro, do cinema à telenovela. Em sentido positivo, o
existencialismo passa a ser uma filosofia "em moda", da
qual é impossível estar ausente.
Dadas as circunstâncias em que emerge, o existencialismo é uma
corrente de pensamento muito diferente das correntes
racionalistas que a antecederam, com relevância para o
cartesianismo. Como diriam os seus cultores, é uma
filosofia que se preocupa, não com as formas abstractas
de pensamento, não com os encadeamentos lógicos, não com
os sistemas em que é preciso enquadrar o ser humano, mas
sim com o homem concreto, o homem em situação, o homem
que vive, que ama e sofre. E, nesta medida, é uma
filosofia que recusa a redução do homem ao plano
conceptual das «lógicas» que imperavam e que voltam a
imperar, em força, neste tempo que vivemos. Veja-se o
que se passa com a organização da Europa, onde reinam as
tecnocracias, e os homens sem rosto, eufemisticamente
ditos: os mercados.
Uma vez que, o que caracteriza o homem, enquanto pensamento, não é
a objectividade (estatística), mas sim a sua
subjectividade; e sendo esta o ponto de partida do
ser consciente, é a partir desta consciência que o homem
pode alcançar a objectividade, e não o contrário. É com
o meu pensamento que inicio o meu percurso consciente, e
não inserto em espartilhos saídos de estereótipos por
outros pensados, elaborados e impostos.
Partindo do primado da pessoa humana, afirmar-se-á que o
existencialismo não é uma filosofia que se compare aos
sistemas tradicionais, que procuram formas de unificação
do pensamento, em torno de ideias chave, com vista a um
todo organizado e constituído em sistema. Ao invés, o
existencialismo preocupa-se e ocupa-se com a vida
concreta do homem, com o mistério da vida, com o que se
passa com o ser humano no dia-a-dia. Isto é, os
problemas que a vida traz, os fracassos e as vitórias, a
angústia e o desespero, o absurdo da vida e da morte e,
também, a esperança. Simplesmente, é uma reflexão cujo
fundamento autêntico e essencial é a vida concreta. É,
por isso, uma filosofia do homem concreto.
Este tempo que vivemos, hoje, leva-me a revisitar esta corrente de
pensamento, que continua a fazer sentido no século XXI.
As Guerras que teimam em não parar; as agressões
contínuas, de toda a ordem, à pessoa humana; a
insegurança em todas as suas dimensões; os falsos
democratas que por aí pululam, arrogando-se
perigosamente da luz que ilumina as trevas; a moda das
não ideologias, que nos deixa desarmados, porque ficamos
sem saber quem é quem, ou das ideologias cegas
neoliberais, onde não é difícil encontrar protagonistas,
que estão sempre determinados a aplicar os seus ideais,
como se tem verificado, assim que a oportunidade surge.
É para contrariar esta situação que se justifica o
regresso ao existencialismo, ou, dito de outra forma, à
reflexão continuada sobre os valores que defendem a
pessoa concreta. Sem deixar de agir, é necessário
pensar. Pensar o Homem concreto. Tarefa de que os
filósofos e outros pensadores sociais não se podem alhear, sob
pena de não cumprirem a sua parte de
responsabilidade em prol de uma sociedade justa (António
Pinela, Reflexões, Setembro de 2003).
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