É comum
ouvir dizer-se que os simples mortais não sabem pensar, porque têm o
coração muito ao pé da boca. São impulsivos, emocionais, quase
irracionais... e não sabem articular palavras, e sei lá o quê!
Quem é
que sabe pensar? Por certo, uma classe privilegiada. Uns tantos dotados
de algum Dom que nós, simples mortais, ignoramos. Vale a pena que nos
detenhamos no que dizem algumas sumidades da nossa Praça Pública, digo,
das vaidades.
Vejamos
apenas esta pérola de pensamento: A propósito do alegado envolvimento do
Dr. Paulo Portas, no caso Moderna, um jornalista da RTP interroga o sr.
Advogado António Pires de Lima, que por sinal até já foi bastonário da
Ordem dos Advogados. Pergunta o Jornalista, mais ou menos assim: O que
pensa do que dizem os políticos acerca deste caso:
Responde o sr. Advogado: Nunca tive a veleidade, mesmo enquanto fui
bastonário, de tentar sequer perceber o que os políticos pensam, porque
pensam, se é que pensam! (RTP, 28.05.03 - Jornal 2, Telejornal).
Na
nossa modesta opinião, e enquanto ser pensante e,
transitoriamente, a exercer alguma actividade política, pensamos
que é muito grave que um distinto advogado de Lisboa, com as
responsabilidades que tem e o exemplo que dele se espera, diga
semelhante barbaridade. E refiro-me apenas à última parte da sua
brilhante frase: «...se é que pensam».
É
grave, muito grave que se diga uma coisa destas. É bom lembrar aos srs.
que proferem, impensadamente, estes disparates que os políticos, os
médicos, os professores, os engenheiros, os operários, os funcionários
públicos, etc., e também os advogados e os juízes são, antes de ser o
que são, homens. E todo o homem se engana, erra, diz asneiras. Ninguém
está acima do erro. O homem é um ser imperfeito. É um ser a caminho.
Logo, é uma personalidade em permanente aprendizagem e aperfeiçoamento,
porque, até ao final dos seus dias, está em constante devir.
Usar o
metadiscurso, olhando de cima para baixo, em pose autoritária e
arrogante não é apanágio dos fortes nem dos sábios. Os sábios só
sabem que nada sabem, são tolerantes e compreensivos, e é por isso que
são sábios. Os que olham obliquamente, julgando-se possuidores de
todo o conhecimento e verdade, não estão seguros da sua missão, daí a
sua arrogância e até desdém para com aqueles que, porventura, tenham
outra visão dos problemas, da vida e do mundo.
Mas,
enfim, como seres caminhantes que somos, e de forma consciente,
preparemo-nos para tudo: para ouvir frases deste estilo e perdoar
aqueles que não sabem o que dizem; compreendamos as outras posições,
mesmo que nos agridam, pois demos delicadamente a outra face (isto é, o
ensinamento) aos pseudo sábios . Eles
ficarão felizes e contentes. E, sobretudo, a seus olhos achar-se-ão de
grande sabedoria. De coisa nenhuma. (António Pinela, Reflexões,
Maio de 2003). |